Por Fernanda Pimenta e Estácio Fernandes
Este painel tem como personagens o filósofo Sócrates e sua esposa Xântipe. Na imagem, ela está jogando água (ou excrementos) na cabeça do filósofo. O painel de azulejo tem indicativos da primeira metade do século XVIII e foi motivado por uma imagem de Otto Van Veen, um pintor, desenhista e humanista que viveu em Antuérpia e Bruxelas no final do século XVI e começo do século XVII. Na página 145 do livro Theatro Moral de toda a filosofia (1776) encontramos a imagem intitulada “A paciência vence os males” (Victrix malorum paciência), que serviu de referência para o painel.
Na mesma página do livro versinhos em um espanhol antigo acompanham a imagem e dizem
Victrix malorum paciencia
Si no tiene remedio
De una muger que es propria, na braveza
Por uno y otro medio:
Confidere el cajado, que es Grandeza
Yr Fuffriendo el viage,
Pues con en el Diablo fe meriò en partage
Socrates pudo folo
Dar el mayor exemplo de fuffrido,
Que havrà de polo à polo,
Y en su Muger Xantipe hoy ha vencido
Del agua la infolencia
Pues la Muger fe vence con Paciencia.
Gran Paciencia ha menefter,
Quien refifte à grave mal:
Pero en efto (al parezer)
Socrates no tuvo igual;
Pues la prueba principal,
Es una mala Muger
(FOPPENS, 1776, p. 144 -14)
Xântipe era a esposa do filósofo grego Sócrates, e juntos teriam tido três filhos. Na literatura europeia, ela se tornou a personificação de uma mulher rabugenta e anti-social. Xenofonte, discípulo e amigo de Sócrates escreveu sobre Xântipe: “como você consegue viver com uma mulher que, eu realmente acho, é a mais insuportável de todas as que viveram, vivem e viverão”.
A má fama de Xântipe provavelmente se deve a dois fatores: o primeiro é que Sócrates nunca escreveu nada, quem escrevia eram seus discípulos que provavelmente convivem apenas com a face mais rabugenta da mulher. E o segundo fator é cultural do período histórico, as mulheres da época ocupavam uma posição de inferioridade social em relação aos homens, não eram tidas como cidadãs e deviam total subserviência aos maridos, por ter uma personalidade forte, era tida como uma mulher “ruim”. Mais recentemente a leitura sobre ela, é a colocá-la como vítima, pois Sócrates teria um comportamento negligente com a família, não parava em casa.
Referências:
Theatro Moral de la vida Humana, en cien emblemas; con el enchiridion de epicteto y la tabla de cebes, philosofo platonico. Brusselas, por Francisco Foppens, impreffor y mercader de libros. 1776
Xénofonte (traução Pierre Chambry), Les Helléniques. A Apologia de Sócrates. Os Memoráveis: Xenofonte, Obras Completas , t. III, Flammarion ,1967